quarta-feira, 18 de junho de 2008

UMA LUZ


“As luzes seguem o conceito de um espaço autônomo, podendo ser modificado e construído pelos próprios atores. O equipamento é similar aos usados em estúdios fotográficos e sets de filmagem. Dualidade: o real é visto com os recursos de luz da ficção”.
Mensagem enviada por Paulo a Rita – início de 2008

Como encontrar poucas linhas...


Aproxima-se o momento em que é preciso dizer às pessoas sobre que temos feito nos últimos meses. Aquele difícil instante de sintetizar em duas páginas tudo o que foi discutido, elaborado (e jogado fora), desejado e, por fim, o que será visto no palco. Nesta hora, a campeã da ingratidão é a sinopse. Aquelas duas, três linhas que ocuparão os “tijolinhos” dos jornais e vão orientar os jornalistas, e, por conseqüência, o público. Essas poucas palavras têm a capacidade de ocupar uma cadeira a mais na platéia de um espetáculo... Ou não! Encontrar uma sinopse é uma das coisas mais ingratas, certamente. Bem no início deste trabalho (para ser mais exato, dia 24/09/2007, às 18:28), a Rita enviou a seguinte mensagem – via celular – pra mim: “O texto ‘Cheiro de Chuva’ é ótimo, mas acho que teria que sofrer muitas modificações. Então, não precisa ser ele. Mas os diálogos são importantes. Sugiro mesmo 1 sinopse. 1 enredo. O mínimo de palavras. Animei de repente”. “O mínimo de palavras”!? O que me alivia é que o cinema, a nobre sétima arte, também padece desse mal. Mas no caso dele, mesmo em produções mais modestas, há sempre um sujeito que fica só por conta disso. Não? Não é possível! Imagino em Hollywood: é óbvio qie existe o sinopsista! Ele recebe uma fortuna por projeto só para encontrar “as palavras” que vão encher os bolsos dos produtores no mundo todo. Como o “traillerista”. Pode ser um dinheiro sem fim, mas eu não ia querer tal função. Muito obrigado. Mesmo. Quantas vezes você já não se pegou lendo cadernos de cultura, guias de Internet ou mesmo os completíssimos programas de festivais e ficou ali, um bom tempo, achando pistas para escolher o que finalmente gostaria de assistir? Já sim. Já pensou em quantos espetáculos, filmes, e por aí vai, já perdeu por conta de uma sinopse sinuosa? Para quem não sabe, elas são divididas em grupos, inspiradas pela topografia de nossas terras: a sinopse-planície, deixa qualquer ainda mais confuso porque pode ser qualquer coisa, não há sinais para onde ir, sem grandes nuances; sinopses-montanhosas são as mais populares no meio “de pesquisa”. Entre descidas e subidas, elas dão uma visão geral do que é a obra, mas logo te colocam em meio a explicações que te confundem e te levam de volta ao ponto zero – como títulos de teses de mestrado. Exemplo: “a peça conta a história de uma menina com um chapéu vermelho”. Até aí tudo bem. Mas não. Ela continua: “... e aborda o conflito da mulher na relação da descoberta da sexualidade em meio às obscuros caminhos da atualidade”. Aposto que lembrou de umas dessas. Tem a sinopse-cerrado, que é mais árida, breve: “o encontro entre duas pessoas na contemporaneidade”. Añ? Tem as tactônicas, que mudam de acordo com a época da peça. Taí a mais sincera forma de escrever uma. Elas começam de um jeito. Dali a pouco, quando você pensa que tudo se “assentou”, que as coisas já estão definidas, os artistas decidem mudar e retomar a discussão: “Nossa sinopse diz realmente o que queremos dizer?”. Ai... Daí, depois de horas de discussão e uma tarde a menos de ensaio, muda-se as pequenas linhas. E pra divulgar a nova versão? Haja assessoria de imprensa e a colaboração dos jornalistas. Estou aqui revisitando os anais da sinopse deste projeto (para lei de incentivo!) e acabo de identificar mais uma espécie: a sinopse-mutante. Já que eles estão tão em voga, por que elas não se adaptariam ao meio. Esta sinopse não á rara é já foi um pouco de cada espécie ao longo da vida. A nossa começou assim: “Com foco no trabalho de interpretação, a peça apropria das possibilidades de comunicação entre linguagens artísticas e utiliza de dois espaços arquitetônicos diferentes como habitat para o diálogo entre duas pessoas em dois situações: um espaço alternativo de reconhecida importância na história da cidade que integrar o período de temporadas e circulação; e o palco italiano e a relação pré-estabelecida entre público e espectador“. Nossa, entendeu? Cabeça, né? Acho que esta não me levaria pra ver. Olha essa, que veio depois de um terremoto... “Uma casa delimitada por objetos e pelo desenho de luz. Duas pessoas: um homem e uma mulher. Várias situações são representadas. Umas curtas, breves. Outras com princípio, meio e fim. Uma sucessão de acontecimentos revela as visões, desejos, o passado e as reflexões para o futuro que resultam em um olhar diverso sobre o ser humano nestes tempos”. Por Deus, até que melhorou, mas ainda tá... Tá... Digamos, difícil de saber qual é a história, não? Qual é a história? Nos últimos dias, nos pegamos com esta questão. Como explicá-las sucintamente para o jornalista e, assim, para o público? Ontem, quase no final do dia, recebo a seguinte mensagem no celular: “Sinopse 1: talvez na tentativa de viver um grande romance, Júlio sonha. Sonha que vive em um musical, em um filme. Assim, obriga sua mulher a entrar neste sonho”. Ass.: Rita. Sim, esta sinopse diz bem da peça que fazemos hoje. Deu pra entender? Olha: “Um homem sonha em viver um grande amor, uma paixão repleta de momentos fortes, marcantes, chocantes, e, pra isso, prende sua mulher neste sonho”. As mensagens de celulares tem marcado nosso caminho. Depois vou postar aqui as mais marcantes... Ah, que dure esta sinopse para sempre (até vir a próxima)! Posted by Paulo Azevedo

Momento "Café Com Cabeca" da equipe (esq. para dir.): Paulo Azevedo, Izabel Stewart, Rita Clemente e Renato Bolelli Reboucas.

Mensagens celulares em nossa história

Vou tentar transcrever algumas das mensagens mais marcantes (ou talvez registradas) que trocamos neste período de criação...

➢ “Estou com a sensação que temos que fazer um trabalho juntos”
Rita para Paulo – 19/05/2007 – 16:11

➢ “Tudo precisa de um começo. E às vezes ele existe mesmo sem que saibamos. Ele é sem a gente querer”.
Paulo para Rita – início de 2008

➢ “Tem uma coisa depois dessa pesquisa que é: juntar os talentos mais originais, os desejos mais autênticos e as conquistas obtidas até aqui para que não seja só um ajuntamento é que esse momento de estudo é importante”.
Rita para Paulo – 24/09/2007 – 18:09

➢ “Love story. Eles começam a peça no fim, se surpreendem e retomam do início”.
Rita para Paulo – 01/10/2007 – 20:02

➢ “Os ovos são segredos que podem gerar alguma coisa. À medida que revelam, envolvem outras pessoas. A situação é julgada por todos ao redor. Chocar é o nome. Cada um trás seus segredos e vivem relações pisando em ovos”.
Paulo para Rita – início de 2008

➢ “Geografia do texto...”
Paulo para Rita – início de 2008

➢ “Isso faz da nossa vida agora uma ficção... por que tudo aqui, daqui pra frente, é muito pouco provável. Vamos começar do zero?”
Paulo para Rita – início de 2008

➢ “As coisas não deveriam passar muito tempo. Deveriam durar só um tempo e não o tempo todo”.
Paulo para Rita – início de 2008

➢ “A história já começou e nem sabemos direito como. Ela veio antes de nós e a encontramos em alguma parte. E ela parte de nós. Trazemos partículas, restos de tudo e todos que vieram aqui, antes. E tudo faz parte de nós”.
Paulo para Rita – início de 2008

Pareces um Pelicano...

CHOCADEIRA

Aos nômades bailantes
“... È possível superar este tempo de assassinos de pessoas sensíveis, como denuncia Artaud, e perceber que o artista escapa desta pena ao se tornar um viajante, um desterritorializado, um constante migrante pendular capaz então de dançar sobre o planeta (...) É necessário reunir todas as artes no mesmo espetáculo, que deve ser refeita a unidade quebrada entre a arte e a natureza, que o artista necessita da colaboração do outro – só assim o espetáculo artístico poderá manter-se poderoso na sociedade do espetáculo”.
Guy Debord sobre a obra de Pina Bausch.

Aos tristes
“...A tristeza é um caminho às vezes necessário para se contemplar a beleza. Para tanto, é preciso mover-se, abandonar o estado de sonolência, de letargia, em busca de um novo espaço, de outra visão. O deslocamento é terapêutico. Através do belo é possível superar a dor ou ao menos esquecê-la. Fundamentalmente, é preciso também ser voraz, devorar o que está à mão...”
Pina Bausch

Aos bem-humorados
“...A questão é: do que o mundo precisa hoje, do que precisamos (...) pra mim, o que realmente é necessário é ver certas ironias, rir de alguma coisa, ter um certo prazer. Estamos num terrível, tenebroso, sério e assustador momento. Então, procuro dar um pouco de balanço, de compensação a tudo isso (...) O humor é, assim, uma estratégia para abalar certezas e, ao mesmo tempo, torná-las palatáveis. Ele é uma forma mais amável de transmitir um conteúdo que em si é mais difícil, complexo”.
Pina Bausch

Aos repetitivos
“A melhor forma já existe e ninguém deveria temer usá-la, mesmo que a idéia básica venha de outra pessoa. Chega dos nossos gênios e originalidades. Continuemos a nos repetir (...) Teremos servido a nós mesmo, à nossa época, à nossa nação e à humanidade da melhor maneira que nos é possível”
Adolf Loos

A balança
“O ser humano é a obra-prima do desequilíbrio. Não há equilíbrio, tudo está em movimento”
Mestre Kikuchi

Pelo teatro
“O teatro é totalmente escravo de sua infra-estrutura material. Falar em encenação é sustentar um discurso que tem pelo menos tanto a ver com aspectos econômicos e políticos quanto a estética”.
Jean-Jacque Roubine

Aos gatos pingados

“Se a multidão se desacostumou de ir ao teatro, se todos nós acabamos por considerar o teatro como uma arte inferior, um veículo de vulgar divertimento por utilizá-lo como um exutório para os nossos maus instintos é porque ouvimos falar por demais que se trata de teatro, ou seja, de mentira e ilusão”.
Antonin Artaud

O título é uma homenagem ao quadro do programa Recorte Cultural, de Michel Melamed.

rita

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ensaio

paulo

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ESTRÉIA

5 de agosto, às 20h, no Teatro Alterosa
Únicas apresentações: 12,19 e 26 de agosto, todas Terças-feiras do mês, sempre às 20 horas.
Info: 3237-6611

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